O Jamal era um camionista ("transportador") da Sagal, um negro alto, que fazia jus ao nome, que significa "belo" em árabe.
Lembro-me dele, imponente, na altíssima cabine do enorme Thornycroft, um camião que era um gigante das estradas e cuja fealdade aumentava a sensação de potência que transmitia..
O Jamal não tinha, muito provavelmente, frequentado a escola mas era dotado de especial curiosidade cultural que o meu Pai muito estimava e estimulava, emprestando ao Jamal revistas e livros e mantendo com ele longas conversas.
A sua profissão e itinerância e os contactos que que ia mantendo com comerciantes, tornavam-no, também, um bom julgador dos sinais da economia, numa fase ainda muito primitiva do sistema de trocas e do marketing incipiente que os comerciantes locais faziam sem o saber, tal como Monsieur Jourdain em relação à prosa.
A determinada altura, um novo comerciante estabeleceu-se "na praça" e a natural curiosidade dos habitantes sobre os efeitos da abertura duma nova loja e sobre a forma como decorria o negócio, levou o Meu Pai a perguntar ao Jamal:
-"Então, como vai o negócio de Fulano?"
O Jamal pensou um pouco e respondeu:
-"Senhor Augusto, é boa pessoas, boa pessoa mesmo. Às vezes dá uma capulana às mulheres, dá sal aos homens, dá chupa-chupa aos "mirraus" (1), trata bem toda a gente."
Meditou mais um pouco, abanou a cabeça e acrescentou:
-"Mas o filho-da-puta parece "monhé" (2), tonelada dele só tem 750 quilos!"
(1) "Mirrau"-palavra macua que significa "criança", "miúdo".
(2) "Monhé" - Ver definição aqui .
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