21.10.11

Jamal

O Jamal era um camionista ("transportador") da Sagal, um negro alto, que fazia jus ao nome, que significa "belo" em árabe.
Lembro-me dele, imponente, na altíssima cabine do enorme Thornycroft, um camião que era um gigante das estradas e cuja fealdade aumentava a sensação de potência que transmitia..
O Jamal não tinha, muito provavelmente, frequentado a escola mas era dotado de especial curiosidade cultural que o meu Pai muito estimava e estimulava, emprestando ao Jamal revistas e livros e mantendo com ele longas conversas.
A sua profissão e itinerância e os contactos que que ia mantendo com comerciantes, tornavam-no, também, um bom julgador dos sinais da economia, numa fase ainda muito primitiva do sistema de trocas e do marketing incipiente que os comerciantes locais faziam sem o saber, tal como Monsieur Jourdain em relação à prosa.
A determinada altura, um novo comerciante estabeleceu-se "na praça" e a natural curiosidade dos habitantes sobre os efeitos da abertura duma nova loja e sobre a forma como decorria o negócio, levou o Meu Pai a perguntar ao Jamal:
-"Então, como vai o negócio de Fulano?"
O Jamal pensou um pouco e respondeu:
-"Senhor Augusto, é boa pessoas, boa pessoa mesmo. Às vezes dá uma capulana às mulheres, dá sal aos homens, dá chupa-chupa aos "mirraus" (1), trata bem toda a gente."
Meditou mais um pouco, abanou a cabeça e acrescentou:
-"Mas o filho-da-puta parece "monhé" (2), tonelada dele só tem 750 quilos!"


(1) "Mirrau"-palavra macua que significa "criança", "miúdo".
(2) "Monhé" - Ver definição aqui .


Procurei entre as minhas fotos mas não encontrei nenhuma de um
Thornycroft  da  SAGAL.  Esta,  encontrada  na  net, via Google,
representa um modelo mais recente mas que dá uma ideia
aproximada da forma dos (para mim) míticos camiões.

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