11.2.12

Os paquetes da "linha de África"

 O PÁTRIA, o navio referido no post anterior

Nos anos 50, as viagens aéreas entre Portugal e as colónias, sobretudo as mais distantes como Moçambique, eram, ainda, uma novidade dispendiosa.
Os voos só tiveram início depois da Guerra, nos finais dos anos 40, a viagem entre Lourenço Marque e Lisboa demorava vários dias, com mais de dez escalas.
Só no início da década de 60, com a aquisição dos enormes Super Constellation, os voos passaram a ser de 23 horas, com escalas em Luanda ou Leopoldville (a actual Kinshasa) e Kano, na Nigéria.
 O Super Constellation
Grande parte da população branca da colónia adoptara o ritmo dos funcionários públicos que, de quatro em quatro anos, tinha direito a gozar, em Portugal, uma longa “licença graciosa” que podia chegar a ser de seis meses.
Por isso, uma viagem de pouco mais do que 10 dias, entre Porto Amélia e Lisboa, nos confortáveis e luxuosos paquetes que faziam a “linha de África”, com várias piscinas, divertimentos, bailes e festas, com magníficas escalas na Beira, Lourenço Marques, Cape Town,  Luanda,  São Tomé, Sal e Funchal era já (ou ainda, no caso de regresso) férias.
É muito persistente na minha memoria uma festa feérica quando se passava a linha do Equador: a sirene do navio soava e alguns tripulantes mais afoitos tentavam convencer as meninas que se sentia “um saltinho” provocado pelo desnível entre as duas metades do planeta. Com risinhos nervosos, as meninas fingiam ter medo e deixavam-se amparar na expectativa do safanão (isto já sou eu a inventar).
Fiz ainda duas ou três dessas viagens e, afora os primeiros dias de adaptação que eram marcados por fortes enjoos, foram dias de brincadeiras e folguedos de que ainda hoje me lembro.
As duas principais companhias que operavam a “linha de África” eram a Companhia Nacional de Navegação e a Companhia Colonial de Navegação.
Hoje, desmantelada a marinha mercante portuguesa por curteza de vistas e espírito tacanho, é difícil imaginar a pujança e tamanho das frotas destas Companhias, compostas de dezenas de navios que serviam rotas para África, para a América e para a Ásia.
A CNN e a CCN concorriam em grande equilíbrio , mantendo um quase paralelismo nas suas frotas.
Os principais paquetes que faziam a ligação entre Portugal e as colónias africanas eram, na CCN, o Pátria, o Império e o Infante D. Henrique, a que correspondiam, na CNN, o Moçambique, o Angola e o príncipe Perfeito.
Quando chegavam aos portos mais isolados e distantes, eram acolhidos em festas, com algazarra e excitação.
Lembro-me de, em Porto Amélia, serem organizados pelos Comandantes dos navios, rutilantes jantares de gala, seguidos de baile, nas salas e salões sumptuosos, que deixavam frustradas as crianças, relegadas para umas festarolas à tarde à volta da piscina, mesmo assim com um lanche e guloseimas.
Essas viagens foram das mais exaltantes aventuras da minha infância.


Nenhum comentário: