29.7.11

A Capela

É minúscula mas de uma simplicidade airosa.
Lembro-me de baptizados vários, casamentos, primeira comunhão, claro...
Mas não me lembro de funerais.
Associo a capela à memória da manhã do domingo em que, reuni toda a minha coragem, embora tremendo interiormente, para declarar o meu recente agnosticismo. Não podia, por isso, assistir à missa!
A reacção parental foi moderada embora revelasse algum espanto ou, mesmo, certa incredulidade, o que, nas circunstâncias, não deixava de ser irónico.
O chão não se abriu debaixo dos meus pés, do céu não brotou nenhum dilúvio de enxofre, não caí fulminado por um raio. Nem sequer fui castigado pelos meus pais!
A heresia já nesses tempos tinha perdido o seu peso.

A Igreja "Nova"







Nova!...

27.7.11

Montepuez na Companhia do Niassa.

Encontro, numa publicação de 1905, (um Relatório do Governador Ernesto Jardim de Vilhena), uma referência ao "Concelho do Medo" (Meto?) e à "sede do concelho, então em Montepues (sic)":


Junto da sede do concelho, então em Montepues, tinhamos o velho regulo Muero, nosso amigo, e quase único fornecedor de carregadores, que não convinha descontentar pela tentatuva de cobrança de qualquer imposto, por muito pequeno que fosse. Cerca do posto de Mualia, o regulo deste nome, seguindo a risca o plano de resistência passiva que adoptara, desde que, annos antes, fora batido, cortara relações com os brancos, quieto mas hostil.


Só há pouco tempo, através de um blog, o ForEver Pemba , me apercebi da grandeza, importância e que tivera o Régulo Mualia, um maiores potentados de todo o Norte islamizado, reduzido, quando o conheci, a uma mesquinha decadência, habitando uma pequena palhota na área do Natupili, uma "machamba" do meu Pai ao pé de Balama, e escondendo, se é que ela ainda existia, qualquer hostilidade ou espírito de resistência...



Compreendo, agora, alguma deferência com que era tratado e porque podia, ao contrário de outros nativos, mesmo que régulos, beber ao seu copo de água sentado à mesa, na varanda da nossa casa.
Estou a vê-lo, alto e elegante, na sua farda de "oficial de 2ª linha". E ao filho, cujo nome se me escapa no momento em que escrevo isto mas que prometo, dentro de algum tempo, aqui registar.





Os Correios


Lembro-me bem da inauguração da Estação dos Correios, sob direcção implacável do "meu primo"
Manuel dos Santos.
Nessa altura (finais dos anos cinquenta?) o edifício, com o seu primeiro andar, era a jóia da modernidade de Montepuez. O progresso parecia, finalmente, ter chegado!

A "Administração"






Perdeu a aura vagamente sinistra com que eu a encarava, desde a primeira vez em que vi, VI realmente, uma sessão de palmatoadas.
Claro que sabia que aquilo acontecia mas era um "saber" distanciado, um pouco asséptico, talvez apenas tintado por alguma curiosidade perversa.
 Mas, dessa vez, vi.
Vi o cipaio agarrar o punho do preso, puxar a mão que este abria porque a pancada da palmatória seria muito mais dolorosa sobre os nós dos dedos.
Vi o “língua” que reproduzia em macua as frases gritadas em português do branco que assistia e ordenava cada nova palmatoada.
Ouvi o grito lancinante que se seguia a cada golpe, um “aiii” uivado em que o “i” se prolongava, animalesco e denso.
Vi as contorções grotescas do corpo em sofrimento, como se fossem convulsões mórbidas.
Foi uma espécie de baptismo da violência racista, a revelação de algo muito obscuro e revoltante que, não tenho dúvidas, me marcou indelevelmente.
Agora, pareceu-me apenas um pequeno edifício airosamente colonial, com as escadas de muito menos degraus, na verdade quase simpático.
Haverá ainda a prisão nas traseiras? Pensei nisso quando passei mas nem o mencionei à Paula. Prefiro pensar que já não existe.

18.7.11

SAGAL

A entrada da SAGAL.
A Sociedade Agrícola Algodoeira foi a empresa que, em Cabo Delgado, aplicou o princípio da produção forçada de algodão que transformou os cultivadores comunais em camponeses.
Obrigados a cultivar algodão a partir de sementes fornecidas pela companhia, vendiam, após a colheita, toda a produção à "concessionária" a um preço fixado por esta.
Esquema típico do colonialismo, com algumas características de trabalho forçado, o sistema fez da SAGAL (e das suas homólogas em relação às áreas concessionadas) a mais forte empresa da zona e a maior empregadora.
A SAGAL e suas congéneres justificavam o dito "o algodão é a mãe da pobreza".

15.7.11

O Hospital





Claro, não era assim; e muito menos era assim que me lembrava dele, era mais soturno e assustador.
No meio dos horrores lembrados, emerge o do tratamento do "dentista" e duma broca mecânica accionada a pedal que, além da dor insuportável, deixava no ar um nauseabundo cheiro igual ao que conhecia de queimar cabelos, actividade bastante apreciada pelo bando dos primos e afins.



Outra vista da casa da Tia Conceição

14.7.11

O campo







Palco de olímpicas pelejas, arena de recontros titânicos!
Por aqui passavam o grande rival Desportivo de Porto Amélia, o Pemba, o Ibo, o incontornável Arsenal de Balama...
Uma vez, lembro-me, chegou a jogar aqui, defrontando o destemido Atlético, o Sporting de Nampula!
Não me lembro do resultado mas os nampulenses,
provavelmente, ganharam.
Seja como for, como diria um qualquer jornalista
 desportivo, "fez-se História"!

Tia Conceição



A Tia Conceição ficaria, estou certo, muito intrigada com as parabólicas no telhado.
Mas a casa lá está, ao pé do campo de futebol.
De resto, dela saíam, em direcção ao campo, devidamente equipados, alguns garbosos atletas, impecavelmente equipados com as cores do gloriosos Atlético (branco-negro, mais atarde, por influência "artística" do Manuel Cunha Alegre, encarnado e negro.
O emblema também foi alterado; tinha começado por ser uma cópia adaptada - o "P" de Portugal substituído por um "M" e as listas laterais reduzida a uma, em preto - do do Atlético Clube de Portugal (na imagem) mas com os pergaminhos heráldicos do Manuel Cunha Alegre, dele passou a constar um leão  com a pata sobre uma bola de futebol e a soberba divisa "Um Rugido na Selva".
Mai'nada!

Interrupção (involuntária)

A vida tem destas coisas.
Volto ao blog mas não posso prometer assiduidade quotidiana.