14.10.11

O Dr. Cintra


À direira estão o Dr. Cintra e a Srª. D. Maria João, à esquerda julgo reconhecer um Administrador de Montepuez cujo nome se varreu da minha memória; entre eles, claro, os meus Pais.
A foto deve datar dos anos cinquenta e foi tirada no Natupile, a machamba onde habitualmente vivíamos, ao pé de Balama, a 50 Km de Montepuez.
O Dr. Cintra era o médico que chefiava, em Balama, o Posto da MCT (Missão de Combate à Tripanosomíase, a terrível “doença do sono").
Como é óbvio, o Posto era um verdadeiro hospital, pequeno, mal dotado de meios mas que supria, com dedicação, algumas necessidades básicas das populações mais próximas e fazia do  Dr. Cintra era um dos muitos e obscuros émulos de Albert Schweitzer que pululavam pelas colónias.
Balama, uma pequena localidade onde a SAGAL era a principal empregadora teria, que, além da casa “chefe” da empresa (não sei se era já o “toureiro”  Henrique Granjeia), da MCT e residência do Dr. Cintra, do Posto Administrativo e da casa do respectivo Chefe, haveria, como construções de alvenaria, uma ou duas cantinas.
Mas para crianças que viviam literalmente “no mato”, onde um longínquo ruído de motor de automóvel provocava picos de enorme excitação, amaior parte das vezes seguidos de negra desilusão porque o carro em questão não tinha a machamba como destino, uma ida a Balama era quase uma “ida à cidade”.
O Natupile era a cerca de 15 km e, assim, a Srª D. Maria João, senhora de modos aristocráticos e singular simpatia, e o Dr. Cintra, exuberante e sempre elegantemente ataviado, eram nossos vizinhos e visitávamo-nos amiúde.
Lembro-me do fascínio que despertava em mim uma delicada rede (de seda?) que o Dr. Cintra usava para manter a sua densa, negra e bem penteada cabeleira empastava em brilhantina sem um só cabelo fora do lugar e que, por várias vezes, provavelmente por termos chegado a Balama de improviso, ele ostentava.
E mais impressionado fiquei (sentimento que os meus irmãos partilhavam), quando fui informado que era, sobretudo, para dormir que o artefacto era utilizado.


No verso da foto, escrita com a caligrafia de minha Mãe, está a frase "No pomar do Natupile". Não há indicação da data.

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